Thursday, January 27, 2011

A Rebelião das Massas. José Ortega y Gasset


Extraido do Prólogo para Franceses.

(Prezado leitor, você não precisa de um Doutorado em Linguística para deixar um pensamento seu expresando sua opinião, qualquer que seja). The Blogger.


Definimos a linguagem como o meio de que nos servimos para manifestar nossos pensamentos. Mas uma definição, se é verídica, é irônica, encerra tácitas reservas, e quando não a interpretamos assim, produz funestos resultados. Assim esta. O de menos é que a linguagem sirva também para ocultar nossos pensamentos, para mentir. A mentira seria impossível se o falar primário e normal não fosse sincero. A moeda falsa circula apoiada na verdadeira. No final das contas, o engano vem a ser um humilde parasita da ingenuidade.

Não; o mais perigoso daquela definição é o acréscimo otimista com que costumamos escutá-la. Porque ela mesma não nos assegura que mediante a linguagem possamos manifestar, com suficiente justeza, todos os nossos pensamentos. Não se arrisca a tanto, mas tampouco nos faz ver francamente a verdade estrita: que sendo ao homem impossível entender-se com seus semelhantes, estando condenado à radical solidão, esgota-se em esforços para chegar ao próximo. Desses esforços é a linguagem que consegue às vezes declarar com maior aproximação algumas das coisas que acontecem dentro de nós.
Apenas. Mas, habitualmente, não usamos estas reservas. Ao contrário, quando o homem se põe a falar, isto faz porq ue crê que vai poder dizer tudo que pensa. Pois bem, isso é o ilusório. A linguagem não dá para tanto. Diz, mais ou menos, uma parte do que pensamos e põe uma barreira infranqueável à transfusão do resto. Serve bastantemente para enunciados e provas matemáticas; já ao falar de física começa a ser equívoco e insuficiente. Porém quanto mais a conversação se ocupa de temas mais importantes que esses, mais humanos, mais "reais", tanto mais aumenta sua imprecisão, sua inépcia e seu
confusionismo. Dóceis ao prejuízo inveterado de que falando nos entendemos, dizemos e ouvimos com tão boa fé que acabamos muitas vezes por não nos entendermos, muito mais do que se, mudos, procurássemos adivinhar-nos.


Esquece-se demasiadamente que todo autêntico dizer não só diz algo, como diz alguém a alguém. Em todo dizer há um emissor e um receptor, os quais não são indiferentes ao significado das palavras. Este varia quando aquelas variam. Duo si idem dicunt non est idem. Todo vocábulo é ocasional (l). A linguagem é por essência diálogo, e todas as outras formas do falar destituem sua eficácia. Por isso eu creio que um livro só é bom na medida em que nos traz um diálogo latente, em que sentimos que o autor sabe imaginar concretamente seu leitor e este percebe como se dentre as linhas saísse u'a mão
ectoplástica que tateia sua pessoa, que quer acariciá-la - ou bem, mui cortesmente, dar-lhe um murro.

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